sábado, 7 de fevereiro de 2009

A nau dos aflitos


Algo estava errado?

A tripulação parecia entorpecida

navegavamos em círculos ou o timoneiro adormecera.

Quando consegui abrir os olhos

vi o clarão da lua

no lado oposto uma luz muito forte.

Seria o sol?

Algo estava errado?

Ninguém respondia

as almas mergulhadas no Estige

buscavam salvação a bordo


Tentei puxar um homem

só então vi tratar-se de um bandido

talvez um demônio

talvez fosse eu.

O Estige parecia um mar, morto?

Ondas de carne castigavam o casco

da nave perdida.

Caronte dormia,

uma jovem chorava!


Por um amor despedaçado?

Perdido entre promessas de eterna fidelidade?

Um homem velho arreganhava os dentes

num sorriso dos loucos

perdido entre águas sangrentas

de almas condenadas!


Sua mão indecisa alcançou o meu ombro,

um tremor de nojo e desespero tomou todo

o meu corpo.

Ele nada dizia mas eu ouvia seu clamor

pedia meu perdão e jurava nunca mais

cometer tão violento crime.


Entre lágrimas e soluços

pedia-lhe pelos santos que me soltasse,

pois nada eu saberia sobre ele e sua consciência.

Ele parou de sorrir,

seus olhos derramavam lágrimas de sangue.

Eu o perdoei,

sem saber porque,

sem ouvir seu nome.

Sem viver a sua dor.


O homem soltou-se na correnteza,

eu suspirei aliviado.

O barco retomou o seu rumo.

Olhei para trás e pude ver o barqueiro

empunhando o leme.

Tentei em vão olhar o homem

já estava perdido entre milhares

de corpos sem luz.


Caronte cantava retesando o torso ao leme

Não tive mais medo

meu lugar não era ali

eu nem sabia

onde estava

ou se sonhava

ou se aquilo,

em alguma vida, vivi.


4 comentários:

Cynthia Lopes disse...

Adorei a idéia e os versos de um surrealismo teatral! O ato de uma peça teatral, adorei, mil bjs

Cynthia Lopes disse...

Não posso deixar passar em branco: obrigada por publicar o poema que lhe fiz. Você foi de uma enorme gentileza. Com todo meu carinho e meus beijinhos...

Ricardo Kersting disse...

Talvez sejamos mesmo, protagonistas e coadjuvantes!
Beijos

Ricardo Kersting disse...

Como poderia eu deixar passar em branco? Não é para qualquer um ter um poema por Cynthia Lopes dedicado, estou muito feliz.
Beijos muitos.